Se você já maratonou alguns doramas de romance, provavelmente já passou por dois sentimentos contraditórios que eles despertam: primeiro o encanto, o coração acelerado com cada cena fofa, e, depois de um tempo, um certo cansaço e tédio com a mesmice.

É quase como um relacionamento longo que cai na rotina: no início, tudo parece novidade, mas com o tempo, tudo parece mais do mesmo e não oferece mais novidades para envolver.
Mas por que isso acontece? E, ao mesmo tempo, por que seguimos assistindo com tanto carinho, mesmo já sabendo de cor muitos dos truques narrativos?
Vamos conversar sobre os dois lados dessa moeda.
O encanto dá lugar ao cansaço

Clichês previsíveis
Quase todo dorama tem aquele momento em que o casal principal pega nas mãos um do outro sem querer, ou então a cena do "quase beijo" interrompido por alguém/algo que os surpreende, estragando o momento. Em Boys Over Flowers, por exemplo, isso se repete tantas vezes que o público passa a antecipar as cenas.
No começo pode ser divertido, mas após tantos doramas, o público começa a prever que esse detalhe vai acontecer. Isso tira a sensação de frio na barriga que a cena deveria causar, porque já é esperado que ela irá acontecer, e, com a falta dessa sensação, boa parte da emoção vai embora.
Personagens estereotipados
O clássico “CEO frio e arrogante” que só se apaixona pela “garota simples e batalhadora” funciona, mas, usado em excesso, como é o caso da maioria dos doramas, cansa. Em The Heirs isso acontece: Kim Tan, o herdeiro rico, se envolve com Eun-sang, a garota humilde.
A química entre eles existe, mas os estereótipos são tão rígidos que chega a faltar mais complexidade na criação ou desenvolvimento dos personagens. Eles precisam de dilemas reais e nuances para que se pareçam menos caricatos.
Muitos espectadores hoje querem ver personagens mais humanos, com falhas reais. Afinal, até no romance, a gente quer sentir que a história poderia acontecer de verdade.
Ritmo arrastado
Quantas vezes você já pensou: “esse problema podia ter sido resolvido em três episódios, ao invés de em 10”?
Muitos doramas alongam tramas simples com repetições e enrolações desnecessárias. O resultado é que o público percebe esse alongamento da trama e se sente enrolado junto, perdendo parte do interesse do enredo principal que o motivava a acompanhar a história de início.
Como em Playful Kiss, em que o romance de Ha-ni e Seung-jo poderia ter se desenvolvido com mais objetividade, o que irritaria menos parte do público que realmente não gostou do romance.

Conflitos forçados
Famílias que odeiam a relação do casal, vilões caricatos ou segredos guardados por pura teimosia são recursos comuns para manter os protagonistas afastados. Só que, quando esses obstáculos não têm peso real, soam artificiais.
Personagens que escondem informações importantes apenas para esticar a trama, deixando claro que o obstáculo não vem da história em si, mas da necessidade de atrasar a relação. E nada irrita mais do que um conflito sem sentido, que poderia ser resolvido de uma maneira simples, que claramente existe só para atrapalhar o casal de ficarem juntos de uma vez.
Um exemplo disso é o dorama Love Alarm, onde alguns podem dizer que muito dos problemas de JoJo se resolveriam mais rápido com uma boa conversa com um psicólogo.
Personagens que mudam de comportamento
Esse é um detalhe que atrapalha muito: quando um personagem construído como comunicativo, leal ou sincero, de repente, deixa de falar algo importante, não porque faz sentido para ele, mas apenas para que a trama dure mais tempo ou para que algo aconteça em resultado da mudança. Essa quebra de coerência é percebida pelo público e gera frustração, porque soa artificial. É como se o roteiro trocasse a personalidade do personagem para o momento.
Em Nevertheless, Jae-eon é descrito como manipulador e sedutor, mas em certos momentos age como vulnerável e sincero, sem que exista uma transição para essa mudança. Já Na-bi, que começa racional, se contradiz para justificar recaídas no romance. Esse tipo de incoerência frustra o público, que passa a não confiar mais no personagem.
Finais apressados
Após muitos episódios de enrolação desnecessária, chega o último capítulo e, em quinze minutos, tudo se resolve: confissão, perdão, casamento, beijo e fim. Esse tipo de final dá a sensação de que o público esperou muito para receber quase nada.
Um exemplo disso é A Virtuous Business, onde um grande problema se apresenta no final, e não se mostra ao público como ele se resolve, apenas uma passagem de tempo e a protagonista com seu negócio sendo um sucesso. Quem acompanhou a história desde o começo e quis ver o crescimento da personagem e não testemunha isso, se sente enganado.
Por que continuamos assistindo?

Essa é a parte curiosa: apesar de todos esses problemas, esses doramas continuam populares, e não só populares, mas amados por todos que os consomem.
Apesar das fórmulas batidas que incomodam e até frustram o público, existem motivos para que esses romances continuem sendo um sucesso.
O conforto do Saber e do Sentir
Conforto da Previsibilidade
Saber que, no fim, o casal vai ficar junto é quase terapêutico. Em um mundo caótico, cheio de incertezas, é reconfortante mergulhar numa história em que o amor vence, em que sabemos que tudo ficará bem. Esse “final feliz garantido” funciona como um oásis contra a ansiedade da vida real.
Em Crash Landing on You, todos sabiam que Yoon Se-ri e Ri Jeong-hyeok dariam um jeito de se encontrar apesar das barreiras políticas. A previsibilidade aqui não foi vista como defeito, mas sim como uma promessa de que "no final, tudo acaba bem".
A fantasia escapista
Doramas são lindos. Os cenários, as roupas, a trilha sonora. Tudo é pensado para criar um clima que envolve quem consome. Mesmo que a história seja repetitiva, o público se encanta com o pacote visual e emocional. É como visitar sempre o mesmo lugar, mas nunca enjoar porque o ambiente é acolhedor e aconchegante.
Goblin é o exemplo máximo: mesmo quando a narrativa se prolonga, é impossível não se distrair com a bela fotografia e a atmosfera quase mágica. A estética se torna um refúgio emocional que, antes de nos incomodar, agrada aos sentidos.
Arquétipos que funcionam
O “rico arrogante” e a “moça batalhadora” são clichês, mas também são arquétipos fáceis de identificar. Isso faz com que qualquer pessoa, de qualquer lugar do mundo, consiga mergulhar na trama, se espelhar nela. E mesmo repetida, é como encontrar alguém com quem convivemos, somos, ou temos tratos sociais.
Em Secret Garden fazem isso usando-se de um detalhe criativo: a troca de corpos entre o CEO Joo-won e a dublê Ra-im, o que gera um detalhe a mais do que apenas a recorrente história da plebeia e do príncipe encantado.

O Valor da Pureza
Enquanto muitas produções ocidentais partem logo para cenas mais explícitas, os doramas trabalham com gestos sutis, com um desenrolar mais tranquilo: um olhar demorado, um toque na mão, o abraço desconcertante. Essa abordagem mais delicada conquista justamente porque transmite emoção sem precisar mostrar tudo, sem precisar apelar apenas para o fator físico da atração, entregando assim que o amor está também, e talvez até mais, em pequenos gestos, momentos e lembranças.
Em It’s Okay to Not Be Okay, o romance cresce na vulnerabilidade e no cuidado entre Moon-young e Gang-tae. É desse tipo de delicadeza que tantos fãs se agradam.
Identificação emocional
Mesmo com seus exageros, os doramas exploram sentimentos universais: insegurança, medo de não ser amado, coragem de enfrentar barreiras sociais ou familiares. Esses temas fazem parte da vida real e, por isso, criam identificação imediata com quem assiste. Saber que, apesar de uma cultura tão diferente, somos todos iguais em nossos problemas emocionais.
Em True Beauty, acompanhamos as inseguranças estéticas e o primeiro amor da jovem Lim Ju-kyung, que é sempre ridicularizada por sua aparência, e tenta através de uma coisa que está ao alcance de muitas garotas (maquiagem) mudar a visão que tem sobre si, aumentando sua autoestima.
Qual a menina que nunca se sentiu feia diante do espelho, se comparando com outras garotas? Isso nos identifica com Lim, e é aí que mora o encanto.
Comunidade e Nostalgia
Assistir doramas não é só uma experiência individual, é também coletiva. Fóruns, grupos, memes, playlists de trilhas sonoras. Dá vontade de falar com a amiga que também assiste, que nos faz conversar com a mulher da fila do mercado que descobrimos que também viu aquele dorama que estamos assistindo. Isso tudo cria a sensação de pertencimento. Além disso, rever um dorama cheio de clichês pode trazer memórias boas, aquele calor bom no coração chamado nostalgia.
Descendants of the Sun foi um fenômeno mundial não apenas pela história de amor entre o Capitão Yoo Shi-jin e Kang Mo-yeon, mas pelo impacto cultural, sendo um drama que chegou a ser exibido até mesmo na Coreia do Norte, gerando impacto econômico e cultural para a Coreia do Sul.
E No Fim...
O que parece contraditório é, na verdade, a essência dos doramas de romance: eles são, ao mesmo tempo, encantadores e cansativos.
Cansam porque muitas vezes se apoiam em fórmulas, repetem estereótipos, criam conflitos desnecessários e até sacrificam a coerência dos personagens. Mas encantam porque oferecem aquilo que promete: amor, emoção, beleza e finais que aquecem o coração.
Talvez seja justamente isso que os mantém vivos: a mistura de familiaridade e emoção, aquilo que, mesmo repetitivo, continua tocando fundo o público.
E você, quando assiste a um dorama de romance, sente mais o encanto de sentir o conforto de algo familiar ou o cansaço da fórmula repetida?

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