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Joe Goldberg em “You” - Análise do Perfil Obsessivo e a Jornada Até a 5ª Temporada

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Sucesso desde sua primeira temporada, You chega ao fim. Saiba mais sobre o desfecho de um dos serial killers mais populares do últimos tempos com uma análise psicológica detalhada!

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Traçando o perfil obsessivo de Joe Goldberg da série You

ATENÇÃO! Esta análise, como qualquer análise profunda que destrincha o perfil psicológico de um personagem tão complexo quanto Joe, da série You, contém spoilers. Portanto, se você ainda não assistiu à quinta e última temporada, por favor, saia deste texto.

Antes de ler, confira o trailer da 5ª temporada:

Como a questão estética é um elemento determinante na série You

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Joe é um homem que, no contexto da série e pela fama já associada a Penn Badgley, se destaca por sua inteligência e pela capacidade de seduzir diversas mulheres. Isso não ocorre apenas por sua lábia ou conhecimento advindo da intelectualidade típica de quem cultua os livros como “arma e escudo para trocas de experiências”, mas também por sua beleza. Esse acaba sendo seu principal trunfo para atrair e, ao mesmo tempo, atacar suas vítimas.

Por mais que a beleza na sociedade seja algo subjetivo, ao considerarmos o apelo popular do histórico de Penn Badgley e o fato de se tratar de uma obra ficcional sobre um homem-monstro capaz de assassinar mulheres e homens e sempre escapar, entramos em discussões mais profundas sobre o “assassino fofo”.

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Essa visão foi propositalmente explorada pela autora do livro. Ela exemplifica, mesmo que indiretamente, uma espécie de hibristofilia normalizada na sociedade. Isso significa que as pessoas tendem a se afeiçoar por pessoas bonitas, mesmo que sejam serial killers, como é o caso de Joe. Isso acaba acontecendo ao longo de todas as temporadas de You.

Aspectos psicológicos na construção do personagem Joe Goldberg

Joe é, em sua complexidade, fruto da criatividade da autora, bem representado pela atmosfera sombria e o suspense apresentado em momentos-chave da série. A trama sempre é mostrada sob seu ponto de vista. Por isso, a paixão adquirida pela fanbase pelo homem bonito que comete crimes, mas é intelectual, é comparável a um pé calçado em sapatos antiderrapantes escorregando em uma casca de banana: inevitável e problemático ao mesmo tempo. A responsabilidade também recai sobre quem assiste. Essa é a graça do audiovisual: gerar debates.

A obra foi planejada nos mínimos detalhes, nos induzindo a acreditar em algo tão veementemente que isso vira motivo de discussão entre quem concorda e quem discorda das atitudes do personagem. Assim, a dramatização reflete consequências no público-alvo.

Dizer que Joe é complexo se deve ao fato de que a sociedade não enxerga nele uma execução linear de seus pensamentos. Existe um desvirtuamento do politicamente correto. Estamos falando de alguém que comete crimes, o que poderia ser simples de entender. Ele é, e sempre foi, alguém com problemas mentais e psicótico. Entender isso não é complexo. O difícil é compreender a linha lógica que leva um ser humano a se tornar o que ele se tornou. Isso, sim, é complexo. Embora as justificativas “quero ser mal porque sofri” sejam controversas dentro da psicologia, com Joe temos um personagem que carrega traumas de uma infância violenta, refletidos nos crimes que comete quando adulto.

Penn Badgley e seus personagens e o uso da internet e da tecnologia como arma

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Penn Badgley, com seu jeito golden retriever de ser, já conquistava o público desde a época de Gossip Girl (2007-2012), quando interpretava Dan Humphrey, o garoto excluído e apaixonado pela garota mais popular, e que já era um projeto de stalker. Isso, inclusive, antes mesmo do termo ser amplamente conhecido.

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Talvez Gossip Girl tenha sido uma das primeiras séries a abordar o poder de controle e manipulação que a tecnologia, juntamente com a internet, pode proporcionar. Na época, ainda não havia tantos recursos como hoje, mas Dan (Badgley) e outros personagens já conseguiam causar sérios danos na vida de diversas pessoas, sempre visando seus próprios interesses.

Já em You, o uso da tecnologia e das mídias sociais é uma das ferramentas de Joe (Badgley) para encontrar suas vítimas. Afinal, toda vez que Joe se apaixona por uma nova mulher, mais cedo ou mais tarde ela acaba virando uma vítima, seja por não ser fiel ou por desistir dele. Conviver com Joe é praticamente um ultimato: ficar ao lado dele e amá-lo, ou morrer.

Guinevere Beck (Elizabeth Lail), Candace (Ambyr Childers), Love Quinn (Victoria Pedretti) - todas, assim como outras pessoas próximas a elas, foram alvos e vítimas fatais da obsessão de Joe. Uma obsessão desenvolvida desde as primeiras temporadas, com flashbacks de uma infância marcada pela violência e abandono, principalmente pela mãe. Isso talvez explique sua obsessão por mulheres, seu desejo de ser amado e até o fato de fazer o impossível para mantê-las por perto.

Análise das temporadas de You: Como a obsessão e a sina de Joe se desenvolveram até a reta final

1ª Temporada ‘You’ (2018)

Foi o início de tudo. Fomos apresentados ao personagem, seu alvo Beck (Elizabeth Lail) e a tudo o que fez para conquistá-la. Joe já eliminava todos os obstáculos para tê-la só para si.

A primeira temporada de You merece destaque por ser um fenômeno na Netflix e na cultura em geral. Joe quase se torna sinônimo de stalker, tamanhas eram suas investidas, invadindo contas, computadores e celulares para saber tudo da vida das pessoas e tirar proveito disso.

2ª Temporada ‘You’ (2019)

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Na segunda temporada, vemos um Joe fugindo do passado. Apesar de ter encontrado alguém para assumir a culpa por seus crimes anteriores, não queria ficar em Nova York, já sem sentido para ele. Joe se muda para Los Angeles querendo uma nova vida. Tenta deixar para trás sua sina por mulheres e o passado sombrio, mas logo conhece uma nova vítima e o ciclo de crimes se repete - desta vez, com Love (Victoria Pedretti).

A grande surpresa da temporada é que Love acaba sendo tão sádica quanto ele. Por ciúmes, ela mata Delilah (Carmela Zumbado), síndica do prédio de Joe, e Candace (Ambyr Childers), ex-namorada dele. Ao descobrir isso, Joe pensa em eliminar Love, mas ela está grávida e usa isso como trunfo para sobreviver.

3ª Temporada ‘You’ (2021)

Agora, Joe e Love formam uma família com a chegada de Henry. Apesar de o menino ter pais assassinos, há uma diferença entre eles: a motivação. Joe mata quase de forma instintiva e busca enganar a si mesmo com justificativas de “um propósito maior”. Pensa estar ajudando sua amada ou o mundo ao eliminar “pessoas indignas”. Love lembra o Joe da primeira temporada, matando para manter a família. Isso acaba sendo sua fraqueza, e Joe vê que não pode viver com alguém tão parecido consigo, ainda mais quando tem um filho no meio do caos.

Joe acaba conhecendo a bibliotecária Marienne Bellamy (Tati Gabrielle), mas Love descobre e tenta alertar Marienne sobre quem ele é. Após saber da traição, Love tenta dar um fim em Joe, mas, mais uma vez, ele é rápido, forjando sua própria morte, matando a esposa e deixando Henry com uma nova família.

4ª Temporada ‘You’ (2023)

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Joe adota uma nova identidade em Londres. Lá, vive como o professor universitário Jonathan Moore, lecionando língua inglesa e literatura. Revê Marienne Bellamy (Tati Gabrielle), com quem se envolveu em Los Angeles. Ela foge para Paris após descobrir quem ele era.

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Livre de Marienne, Joe investe em Kate Lockwood (Charlotte Ritchie), seu novo alvo - mulher de família nobre e com influência na mídia e política. O diferencial da quarta temporada é colocar Joe como alguém tentando entender quem está cometendo os crimes ao seu redor, até descobrir no final que era ele o tempo todo. Assim, o personagem reúne traços de sociopata, narcisista, psicótico, e também desenvolve Transtorno Dissociativo de Identidade (TDI).

É como se ele mesmo já não quisesse mais ser um serial killer, querendo se livrar desse lado sombrio para levar uma vida limpa. Mas, enquanto tenta esquecer seus crimes, Joe mantinha Marienne em cativeiro, pois ela sabia de seus crimes passados.

Marienne vira seu elo com o passado, jogando em sua cara que ele é misógino e um assassino em série. O lado obscuro de Joe ressurge e toma o controle dos acontecimentos. Apesar disso, Marienne consegue escapar com ajuda de Nadia (Amy-Leigh Hickman) e, para se vingar, Joe faz Nadia levar a culpa por seus crimes.

E onde Kate entra? Para viabilizar a quinta e última temporada, Kate vira cúmplice: aceita ficar com ele, mesmo conhecendo o passado, pois também tem segredos que Joe sabe. Esse envolvimento e o da Love mostram o padrão da hibristofilia: mulheres que, mesmo sabendo do histórico do homem, se entregam a ele.

Ao fim da temporada, Joe e Kate entram em um casamento de conveniência, interessante para ambos. Juntos, vivem como parte da elite nova-iorquina.

Quinta Temporada de You: A Fantasia Assassina de Joe Goldberg Persiste

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Lendo a trajetória de Joe até a última temporada, percebemos que sua obsessão por matar está ligada a desejos momentâneos e voláteis. O prazer em matar está associado à realização de fantasias sexuais. Ao encontrar um “alvo”, está disposto a eliminar qualquer um que atrapalhe sua fantasia imediata.

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Se na quarta temporada ele tentou esquecer seu lado violento e assassino para viver “normalmente”, na quinta ele não se importa mais. Agora é rico, tem uma esposa que o aceita e está junto do filho, Henry.

Mas uma nova mulher surge na livraria Mooney’s, tornando-se a nova obsessão: Bronte (Madeline Brewer), uma mulher misteriosa, aparentemente foragida e vivendo nas ruas, despertando em Joe o desejo de cuidar e proteger.

A chegada de Bronte muda Joe, e Kate percebe isso - um sinal de alerta. Kate começa a enxergar quem Joe realmente é e reconhece sua situação. Joe, por sua vez, tenta resistir às novas fantasias por Bronte.

Conclusão: Preso, mas amado: O psicopata que derrete corações (mesmo atrás das grades)

O grande destaque da temporada é que Bronte, na verdade, é parte de uma armadilha preparada por pessoas direta ou indiretamente vítimas de Joe, que querem justiça. Conscientes do modus operandi dele, o grupo liderado por Dominique (Natasha Behnam) e Clayton (Tom Francis) usa Bronte como isca e Clayton como ex-namorado agressivo, para pegar Joe em flagrante. Mesmo ao vivo no TikTok, Joe consegue matar Clayton.

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Apesar de ser preso, Joe responde em liberdade porque Kate paga fiança, mas durante o processo abre mão da guarda de Henry, momento em que Kate inicia seu próprio plano de vingança. Finalmente, ela acorda e reconhece o que foi capaz de fazer por alguém que não vale a pena.

Além da fiança, Bronte, por conta dos traços de hibristofilia, inocenta Joe em seu depoimento sobre Clayton. Ela afirma que Joe agiu para protegê-la, mesmo sabendo que tudo foi armado para expô-lo. Enquanto Kate tira a venda dos olhos, Bronte passa a usá-la.

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Após fugir, à la Bonnie e Clyde, com Joe, Bronte decide pôr fim ao círculo de crimes. Mas morrer seria fácil para Joe, que já tirou tantas vidas. Em uma das cenas finais, ele diz: “Atire em mim antes que eles cheguem!”. Bronte percebe que não: matar não é o final que ele merece - a prisão é. Assim, Joe é condenado a lidar com seu maior pesadelo: a solidão.

Finalmente preso, Joe precisa enfrentar a loucura na solidão. Por mais que tenha defeitos, há uma crítica sobre essa “loucura coletiva”, dividida com a sociedade. O gran finale deixa clara a metalinguagem: Joe, o assassino fofo, começa a receber cartas de fãs apaixonadas, trazendo à tona a hibristofilia.

Embora seja ficção, isso já ocorreu no mundo real, como com Ted Bundy, James Holmes ou, no Brasil, Francisco de Assis, o Maníaco do Parque. Todos receberam cartas e declarações de amor.

A mensagem final da série aborda isso: ser um assassino em série é gravíssimo, mas também é grave o fato de algumas mulheres se afeiçoarem a criminosos pela aparência.

Vou ficando por aqui. Até a próxima análise!