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Análise de Amores Materialistas: Quando o Amor vira Produto

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Depois de estrear com o aclamado Past Lives (2023), Celine Song retorna com um filme que troca a nostalgia pelo sarcasmo. Materialists é um romance moderno que provoca risos desconfortáveis, constrangimentos elegantes e um questionamento inevitável: quanto custa o amor hoje em dia?

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تمت مراجعته من قبل Tabata Marques

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Sobre Amores Materialistas

Lançado nos cinemas no meio do ano e agora disponível no streaming HBO Max, o longa rapidamente entrou entre os mais assistidos da plataforma. A mistura entre comédia romântica e crítica social pegou o público de surpresa e dividiu opiniões da crítica, que esperava da diretora outro mergulho melancólico como em Vidas Passadas.

Mas Song faz o oposto: em vez da dor do que não foi vivido, ela explora o vazio do que foi comprado.

Com um olhar clínico e uma mise-en-scène impecável, Amores Materialistas (em inglês, Materialists) transforma a busca por amor em espetáculo. Entre jantares sofisticados, diálogos cortantes e silêncios afiados, o filme se torna uma vitrine de desejos embalados para presente. É bonito, irônico e cruel, como o próprio mercado amoroso que ele retrata.

Dakota Johnson como Lucy
Dakota Johnson como Lucy

A bolsa de valores do amor

A protagonista Lucy (interpretada por Dakota Johnson) é uma casamenteira em Nova York que organiza encontros para clientes milionários, baseando-se em uma matemática afetiva que combina dados, aparência e status. Para ela, o amor é uma equação a ser resolvida, não um acaso. Sua vida pessoal, porém, não segue a mesma lógica, e quando o trabalho e o desejo se cruzam, a estrutura de controle começa a ruir.

O filme se desenvolve entre encontros cuidadosamente calculados e momentos de descompasso emocional, criando uma sensação de constante desequilíbrio. Celine Song conduz essa trama com uma elegância quase cirúrgica: tudo parece limpo, bonito e vazio. Os personagens circulam por restaurantes caros e apartamentos imaculados, mas o que realmente os move é a insegurança de não serem suficientes, nem emocional, nem financeiramente.

Ao evitar os clichês fáceis das comédias românticas, Materialists se posiciona no oposto: não há trilha arrebatadora nem química óbvia. A tensão vem do silêncio, da dúvida, da ironia. Lucy não acredita mais em amor, mas tampouco sabe viver sem a ilusão de vendê-lo.

Celine Song constrói esse universo com uma precisão que combina o sarcasmo da crítica social com o requinte de um drama urbano. O resultado é um filme que parece leve, mas pesa, pois toca diretamente nas contradições contemporâneas: queremos nos apaixonar de verdade ou queremos um produto montado sob medida para cada um de nós?

Lucy Abordando um possível cliente
Lucy Abordando um possível cliente

Precisão e Ironia

É impossível falar do filme sem pensar na trajetória de Celine Song, uma diretora que estreou já com status de fenômeno. O sucesso de "Past Lives" a colocou sob um holofote raro para uma cineasta sul-coreana radicada nos Estados Unidos, e seu segundo longa carrega o peso de quem precisa provar que o brilho não foi acaso.

A expectativa alta talvez explique a recepção dividida. Mas o que a crítica leu como “frieza” pode ser entendido como coerência estética: Song filma o amor capitalizado com a mesma lógica que critica. Cada plano é simétrico, preciso, impessoal. A câmera observa, mas não se envolve.

Há uma beleza contida na forma como ela enquadra o vazio, o reflexo no espelho, o silêncio em um jantar, a distância entre corpos que deveriam se amar. O requinte visual serve de ironia: o mundo de Lucy é lindo de se ver, mas impossível de se habitar.

Com isso, Celine Song confirma algo importante: seu olhar não é sobre o amor em si, mas sobre o espaço entre o amor e a ilusão dele. Ela não repete Vidas Passadas, e isso é mérito. Prefere se arriscar na superfície e ali encontrar a profundidade.

Lucy e Harry, Interpretado por Pedro Pascal
Lucy e Harry, Interpretado por Pedro Pascal

Ironia cômica

A comédia de Materialists nasce das inversões e dos desconfortos.

Chris Evans, ícone de masculinidade e sucesso, interpreta um homem falido e emocionalmente perdido. Pedro Pascal, o astro carismático do momento, vive um milionário incapaz de demonstrar afeto genuíno. E Dakota Johnson, com sua mistura de charme e frieza, encarna uma mulher que organiza amores perfeitos, mas não acredita merecer um.

O humor aqui é seco, quase cruel. São risos que surgem do constrangimento, não da leveza. Celine Song parece brincar com as expectativas do público: insinua uma comédia romântica clássica, mas oferece um desconforto existencial disfarçado de luxo.

Essas ironias são o motor do filme. Elas expõem a hipocrisia contemporânea: Queremos ser amados por quem somos, mas nos vendemos pelo que temos. O riso, no fim, é apenas o disfarce do incômodo.

Lucy e Harry
Lucy e Harry

Clichê ou crítica?

Apesar de se apoiar em elementos tradicionais, como o triângulo amoroso e o dilema entre amor e segurança: o filme recusa o conforto da previsibilidade. As escolhas de Song vão sempre na direção oposta da catarse.

A química entre os personagens é contida, às vezes inexistente, e isso é proposital: o filme parece querer nos lembrar que o amor real raramente é cinematográfico. Ao invés de buscar um final ultra romântico, cenas impecáveis e casais perfeitamente compatíveis, o filme prefere mostrar como é a realidade disso hoje: Imperfeita.

Lucy e John, intepretado por Chris Evans
Lucy e John, intepretado por Chris Evans

O preço do amor - Vale a pena assistir Materialists?

Materialists não é sobre encontrar o amor, mas sobre encarar o que o amor se tornou. Em tempos de aplicativos, curadorias afetivas e relacionamentos performáticos, a diretora parece dizer que o romantismo virou um luxo, e que ser sincero é quase um ato subversivo.

Celine Song oferece um filme que provoca mais do que consola. Uma comédia sobre a tristeza de amar em um mundo onde tudo tem etiqueta de preço. Bonito, elegante, frio, e exatamente por isso, profundamente humano.

No fim, Materialists não quer que a gente acredite no amor. Quer que a gente perceba o quanto ele foi vendido.

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