Bom Menino: uma perspectiva canina do terror
Quem tem animais em casa, seja cachorro ou gato, provavelmente vai se identificar com a premissa desse filme, que é a de que animais são capazes de ver e ouvir coisas e, teoricamente, possuem mais sensibilidade a manifestações sobrenaturais. Foi inspirado nessa cultura popular de pais de pet que o diretor e roteirista Ben Leonberg criou Bom Menino.
Bom Menino acaba de chegar aos cinemas e vem despertando a curiosidade de todos, pois é todo da perspectiva de um cachorro, só que diferente de filmes como Quatro Vidas de Um Cachorro (2017) ou Sempre ao Seu Lado (2009), ele não é um filme de romance ou drama, mas um filme de terror.
Trailer de Good Boy
O que você deve estar se perguntando é: como isso vai funcionar?
Filmar um terror através dos olhos de um cachorro parece, à primeira vista, uma ideia que tinha tudo para dar errado. Só que Leonberg não se esconde atrás da estranheza, ele a abraça.
A câmera se mantém sempre na altura do cão, com enquadramentos que imitam o olhar, os movimentos e até o ritmo de respiração de Indy, o protagonista de quatro patas (e sim, o cachorro é real, sendo o próprio pet do diretor).
O resultado é um terror de imersão instintiva, onde o medo vem do que o humano não vê, mas o animal sente. As escolhas e a maneira como isso é feito no filme são a parte mais interessante, algo com que quem tem cachorro em casa vai se identificar, como o cachorro ficar latindo para o nada ou estático olhando para um local específico.
Pode um cachorrinho ser um bom ator?
Pode, e Indy prova isso, com toda a sua fofura e desenvoltura canina. O filme depende totalmente dele, e o desempenho é impressionante. Com praticamente zero falas humanas por longos minutos, a narrativa se sustenta nas reações do cão, nas pequenas mudanças de comportamento, no jeito que ele fareja o nada e fica em alerta. É uma atuação que carrega o peso do roteiro nas costas, ou melhor, nas patas.
Indy e seu dono Todd (Shane Jensen) se mudam para uma casa de campo depois que Todd descobre uma doença severa no pulmão. Ele e o cachorro são os únicos habitantes naquela casa enorme e até no entorno, já que o imóvel fica numa região completamente isolada. Só que Indy vai perceber que talvez eles não estejam tão sozinhos assim.

Desde que chega à casa, o cachorro parece sentir algo diferente; ele escuta coisas, sente cheiros e, com o tempo, começa a ver sombras e formas lamacentas. As manifestações ficam cada vez mais intensas, como se o ambiente inteiro estivesse apodrecendo de dentro pra fora. E, curiosamente, à medida que os fenômenos aumentam, a saúde de Todd piora.
O filme sugere que as duas coisas estão conectadas. É aí que mora o charme da história: misturar a sensibilidade real dos cachorros (que conseguem detectar doenças, medo e até mudanças químicas no corpo humano) com a ideia de que eles também podem captar o que está além do mundo físico. É como se Indy estivesse farejando a morte antes que ela chegue.
Como isso foi feito e por que funciona?
O trabalho técnico é, no mínimo, ousado. Leonberg levou cerca de três anos para concluir o filme, e a demora faz sentido: filmar um cão “atuando” em cenas de terror requer paciência, precisão e, acima de tudo, empatia com o animal.
As filmagens são feitas do ponto de vista de Indy e o espectador vê o mundo sempre alguns centímetros acima do chão, o que gera uma sensação constante de vulnerabilidade. Não há truques bobos, nem CGI excessivo: é câmera, som e luz.

O design sonoro ajuda e muito a compor essa atmosfera do medo. Rangidos, respirações, arranhar de unhas no piso, sons abafados que parecem vir do porão, tudo ajuda a complementar essa sensação de tensão sem precisar recorrer a jumpscares baratos.
O diretor também usa o silêncio com inteligência: ele entende que o medo não está no grito, mas na espera pelo grito. Inclusive por essas esperas serem da expectativa do cachorro, são ampliadas ao olhar humano, que até que seja capaz de enxergar, o cachorro já farejou ou escutou faz tempo.
O filme é bom e dá medo?

Depende do que você considera bom. Se você vai ao cinema atrás de monstros, sangue e sustos fáceis, talvez ache o filme parado ou devagar. Mas se você gosta de terror atmosférico, que trabalha com o incômodo e o desconforto, Bom Menino é uma ótima surpresa. Ele incomoda mais pela ideia do que pela execução, e isso é um elogio.
Dá medo, sim. Mas aquele medo instintivo, quase biológico. O tipo que faz você olhar pro canto escuro da sala e se perguntar se o seu cachorro também está vendo algo ali. O medo aqui não é visual, é sensorial: vem dos cheiros, dos ruídos, dos olhares.
É um filme sobre o invisível, e o invisível, como sempre, é o que mais apavora. Mas, se você é do primeiro grupo que prefere um terror mais gráfico, barulhento e cheio de jumpscares, talvez seja melhor economizar o dinheiro do ingresso e aguardar Bom Menino chegar ao streaming.
Direção e dinâmica

Além do tempo que levou para ser gravado e produzido, houve muito estudo e pesquisa por parte de Ben Leonberg e Alex Cannon sobre comportamento canino e reações instintivas diante de medo, perda e ameaça. O objetivo era captar de forma autêntica o que um cachorro realmente faria em um ambiente hostil, sem transformá-lo num personagem humanizado.
No elenco, além de Indy e Todd, aparecem brevemente Vera (Ariella Friedman), irmã de Todd; Richard (Stuart Rudin), o vizinho; e em flashbacks, o avô (Larry Fessenden), sempre vistos de baixo, distantes, às vezes desfocados. Tudo isso reforça que quem conta essa história é o cachorro. Essa escolha visual é o que confere identidade ao filme e é também o que o diferencia de qualquer outro terror recente.
Afinal, vale o ingresso ou é melhor esperar o filme chegar no streaming?
Bom Menino é o tipo de terror que não quer te assustar com volume alto, mas com silêncio. Ele pega uma ideia que podia ser uma piada e transforma num experimento sensorial que funciona melhor do que se espera. Querendo ou não, é uma ideia inovadora pro gênero, mas pouco aprofundada.
Leonberg entrega um terror enxuto de apenas 73 minutos, visualmente inteligente e com um protagonista que, ironicamente, é o mais expressivo do elenco. Não é o terror do ano, mas é original, incômodo e memorável. Por ser original, não porque realmente apavora, até mesmo o tempo é sob medida, porque não teria como aguentar mais do que isso nos cinemas, dada a falta de um roteiro mais aprofundado.
Portanto, se você curte filmes Indies ou diferentões, ele pode valer o ingresso para você, agora se você curte um terror mais assustador, espere Bom Menino chegar aos streamings para tirar suas próprias conclusões.











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